terça-feira, 1 de novembro de 2011

O Brasil acompanha Lula

Reproduzimos abaixo a coluna de  Samuel Celestino  publicada no jornal  "A Tarde" (Bahia) desta terça-feira (1°).

Samuel Celestino (Colunista)
O fato de o ex-presidente Lula ter iniciado ontem o tratamento quimioterápico e  radioterapia (em janeiro) para combater o câncer, a ele transfere todas as condições para vencê-lo. Isso seguramente acontecerá por ser um homem dotado de extraordinário determinismo. Também, não diminuirá em nada (ao contrário) o seu carisma, nem, muito menos, a sua ação política e presença na campanha do próximo ano, mesmo que dela fique distante, o que, a princípio, uma coisa e outra possam parecer um paradoxo.

Esse parágrafo acima apenas acentua uma verdade incontestável: Lula é um mito. Não sem razão os partidos oposicionistas não conseguiram encontrar um caminho para dar-lhe combate político, no que pesem fatos desprimorosos que ocorreram em sua gestão e ainda permanecem, com efeito retardado, no governo de Dilma Rousseff, como comprovam as demissões de seis ministros, cinco deles sob a suspeição de corrupção.

O ex-presidente enfrenta a doença, com elevado percentual de êxito, em torno de 80% segundo os oncologistas. Determinou que se dê conhecimento ao País de todas as medidas médicas adotadas, enfim todo o processo da doença e tratamento. Em outros tempos, recentes até, os políticos brasileiros evitavam dar conhecimento à população de seus problemas de saúde, ou, no máximo, quando não havia mesmo jeito de esconder, mascaravam a doença com diagnósticos mentirosos. Foi assim que a democracia brasileira perdeu Tancredo Neves, abrindo espaço para a tragédia José Sarney.

Arrodeado por médicos incompetentes, que competiam entre si, internado  no péssimo Hospital de Base em Brasília, a junta médica do presidente que deveria tomar posse concordou que informaria à população que Tancredo tinha diverticulite, quando, na verdade, estava com um tumor cancerígeno. Submeteram-no a sete cirurgias, se fizeram fotografar com o presidente eleito numa cena ridícula da história política do Brasil, até que Tancredo Neves, o duende mineiro detentor da esperança que se depositava na sua Nova República, morreu no dia 21 de abril, uma data de muito significado, a começar pela descoberta, ou achado, do Brasil, ao enforcamento de Tiradentes e à inauguração de Brasília.

Aquele episódio foi determinante para mudar conceitos. Os males que atacam a saúde dos políticos passaram a ser divulgados. Lula dá o terceiro exemplo. O primeiro foi com José de Alencar, depois quando orientou Dilma Rousseff, então provável candidata à Presidência, informar (com atraso) que seus médicos descobriram que era portadora de um linfoma, uma espécie de câncer. Enfrentou, se submeteu à quimioterapia, perdeu os cabelos, mas venceu a doença. É o que acontecerá com Lula.

Por uma dessas razões difíceis de explicar, o brasileiro costuma apiedar-se e rezar para a recuperação dos seus ídolos que acabam por se transformar em mitos. Assim posto, por mais que pareça estranho, a doença que Lula enfrenta, expondo-a ao conhecimento do País, o coloca como um personagem maior que passa a reunir, em torno dele, não somente os seus seguidores (e são 80% na pesquisa quando deixou o governo), mas, também, os seus adversários políticos.

Muito provavelmente, a não ser que esteja absolutamente curado (o que é muitíssimo provável), Luiz Inácio não deve participar da campanha eleitoral de 2012, pelo menos nos palanques, porque não estará em condições de forçar a voz, já rouca pelas circunstâncias. Aliás, a rouquidão, em casos como tais, é conseqüência da ausência de treinamento e educação na modulação das cordas vocais, o que se consegue com uma fonoaudióloga.

Lula, no entanto, além da sua exímia qualidade para as articulações políticas, é apaixonado pelos palanques, pela palavra improvisada onde constrói imagens bem ao gosto do povo. Na medida em que usava o palanque praticamente nos três turnos quando presidente, o seu defeito na voz se acentuava, até se transformar num tumor maligno, numa conseqüência conjugada com seus hábitos de fumar e beber, o que jamais negou.

O ex-presidente deverá deixar o tratamento, depois de curado, como uma expressão política maior do que entrou no Hospital Sírio-Libanês em termos de popularidade. Poderá receber recomendações médicas para reduzir as suas atividades usando a fala como instrumento, mas isso só no início. Posteriormente estará liberado. O PT é Lula. Foi ele o seu primeiro líder, quando o partido foi fundado em 1980 no ABC paulista e continuou a ser nesses 31 anos. Do partido foi o primeiro candidato em eleições livres e diretas, em 1989, onde foi derrotado em segundo turno pelo desastre Fernando Collor de Mello, reflexo de um debate em que foi surpreendido com um golpe baixo. Ao todo disputou cinco eleições presidenciais, perdeu as três primeiras, ganhou as duas últimas, e passou o poder a Dilma Rousseff, candidata que ele construiu do nada.

O Brasil se preocupa e o PT sabe que a diferença entre o seu líder maior e os nomes intermediários da legenda (porque nenhum chega próximo) é abissal. Assim, nesses três meses de tratamento quimioterápico e radioterapia a opinião pública o acompanhará. Porque, no que pesem as críticas que a ele são feitas, e é justo que seja assim no Estado Democrático de Direito. Lula da Silva foi e é o maior político produzido pelo País pós-ditadura.


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