por Eliakim Araújo, no Direto da Redação
Os cariocas um pouco mais velhos, digamos aí na casa dos quarenta em diante hão de se lembrar do Buraco do Lume, uma imensa cratera aberta em pleno centro da cidade do Rio de Janeiro, onde uma outrora poderosa empresa do ramo imobiliário pretendia construir sua imponente sede.
Não o fez, quebrou antes. Mas o buraco ficou lá,
aberto, durante anos, sujeito a lixo dos transeuntes e mosquitos transmissores
de doença. Até que algum administrador o tapou e, por cima dele,
realizou um trabalho de reurbanização. Mas enquanto esteve aberto, o famoso
buraco foi batizado pela irreverência carioca como o Buraco do Lume,
pertinho do Largo da Carioca, onde era a praça Melvin Jones, que virou
praça Mario Lago, por proposta do verador petista Eliomar Coelho, na década de
noventa.
Com certeza muita gente se lembra do buraco, mas
pouca gente sabe o significado da palavra Lume, iniciais de Linaldo Uchoa
Medeiros, dono da empresa de financiamento de imóveis Financilar, que reinou na
époica do BNH, o Banco Nacional da Habitação.
Linaldo, pernambucano, foi para o Rio depois de ter
feito o pé-de-meia – e que pé-de-meia – em sua terra. Com o beneplácito
do BNH, meteu-se em negociatas e acabou quebrando. Não sei que fim levou, mas
certamente deve ter saído do negócio rico, leve e solto, como saem todos os golpistas
de nosso amado Brasil.
Faço aqui um corte no texto, sem entretanto fugir do
tema central, para relembrar um dos maiores profissionais do jornalismo
brasileiro, José Gonçalves Fontes, morto no ano 2000. Fontes fez parte da
época de ouro do Jornal do Brasil, onde trabalhou durante 37 anos.
Nesse período, ganhou quatro prêmios Esso de
Jornalismo, além de dezenas de outras premiações. Fritz Utzeri,
outro nome daquela brilhante geração do JB, garante que ele foi o jornalista
mais premiado do Brasil.
O noticiário diuturno sobre a corrupção no alto
escalão do governo, explorada de maneira insidiosa pela mídia de sempre, me
trouxe à lembrança uma das reportagens investigativas de Fontes,
publicada no JB, em 1976, em plena ditadura militar. Essa era, aliás,
sua especialidade, matérias de fôlego que lhe tomavam dias, até meses de
trabalho, na busca da informação precisa e inédita.
Sob o título “Grupo Lume – Um império em
desencanto”, Fontes pesquisou minuciosamente a origem e a
ascensão do empresário Linaldo Uchoa Medeiros.
Linaldo era dono da Financilar, uma das muitas
empresas que surgiram no mercado imobiliário, a partir da criação do falecido
Banco Nacional da Habitação, um banco que deveria ajudar a resolver o
deficit da casa própria para as camadas mais carentes da população, mas que, na
verdade, só construía imóveis para a classe média alta. Incapaz de
cumprir seu objetivo principal e acusado de algumas operações duvidosas,
o BNH acabou desativado e incorporado à Caixa Econômica.
Mas voltando à reportagem de José Gonçalves Fontes
sobre o fundador do grupo Lume. Fontes descobriu em Pernambuco, o Estado de
origem do empresário, algumas passagens do início de sua carreira de
golpista. Soube, por exemplo, que Linaldo se aproximava de um funcionário
influente da Caixa Econômica e propunha-lhe uma aposta nos seguintes termos:
- Aposto um Galaxie como esse
financiamento que estou pleiteando não vai sair.
Não é preciso ser muito inteligente para concluir
que o funcionário ganhava o Galáxie (o carro mais luxuoso da época) e o
financiamento saia. E assim desabrochava a carreira do empresário
pernambucano que logo depois desembarcava no Rio para tentar conquistar a
cidade maravilhosa.
Como Linaldo, quantos novos empresários entram todo
ano no mercado usando estratégias desonestas como essa? Taí uma pequena e
real história de como se corrompe um servidor público e a forma criativa de
oferecer a propina.
O relato de Fontes é dos anos 70 e, de lá para cá,
e desde tempos imemoriais, a corrupção em todos os seus matizes
jamais deixou de frequentar o noticiário. Ela não é privilégio de
partidos ou governos, está impregnada na cultura de nossa gente.
Por acreditar que esse mal tem cura, é que saúdo a
presidenta Dilma, uma verdadeira campeã de audiência na batalha contra a
corrupção, do alto dos seus 64 por cento de aprovação popular, o maior patamar
já alcançado por outro presidente num período de quinze meses.
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