Por Hélio Doyle - 247
Como se previa, todo dia tem um caso novo em que há suspeitas de corrupção, tráfico de influência, favorecimentos. A não ser que haja uma medida de força ou que a imprensa faça um pacto para não falar mais do assunto, ambas as coisas bem improváveis, não tem jeito: vai continuar. Simplesmente porque há muito anos essa vem sendo a rotina no país e enquanto alguém procurar, vai achar. E se alguém delatar, haverá o que contar.
Não adianta, pois, fingir que nada acontece e que tudo passará. O roteiro tem sido mais ou menos o mesmo: surge a denúncia, há negativas e desmentidos, todos estão acima de qualquer suspeita – e aí tudo desmorona. A pergunta que se faz diariamente, em Brasília, é quem será o próximo. Como nos círculos do poder e de sua periferia quase tudo se sabe, as apostas recaem nos mais manjados.As sucessivas denúncias e crises delas decorrentes têm tido um efeito político e pedagógico que começa pelos setores mais politizados e organizados da população, mas depois se espalha. As pessoas estão começando a entender que a corrupção não é apenas uma questão moral, mas que causa prejuízos reais à sociedade. O dinheiro desviado para os corruptos e para os corruptores deixa de ser aplicado em benefício da população, em especial dos mais pobres.
A corrupção é a privatização do dinheiro público. Com ela, não pode haver compreensão nem tolerância, porque é roubo de recursos financeiros que iriam para a saúde pública, para a educação, para a segurança, para a infraestrutura, para o aparelhamento das forças armadas, enfim, para desenvolver o país e melhorar a vida das pessoas.
Mas aí vem uma questão que tem sido colocada pelos que realmente se preocupam com o problema: basta descobrir alguns eventos de corrupção para que todos se sintam satisfeitos? É aquela velha história: a polícia, os órgãos de controle e a imprensa podem até descobrir muitas coisas, mas a essência do problema não será afetada, e a roda continuará girando.
A exploração política dos episódios pela oposição também nada resolve. Primeiro, porque entre os que gritam e pedem CPI estão políticos que fazem e fizeram as mesmas coisas. Segundo, porque embora a aliança de poder esteja sendo minada pelas denúncias, não é a oposição que se beneficia politicamente disso, mas a presidente Dilma Rousseff, que com apoio popular não perderá o controle.
Se implodir a aliança do PT com o PMDB e partidos menores, a oposição pode se beneficiar, sim. E deve ser por isso que seus quadros mais preparados, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, já entenderam que não é boa política bater em Dilma e fazer CPI. Por outro lado, políticos de partidos aliados ao governo, entre os quais do PT, refugam em apoiar Dilma com medo de a “faxina” lhes atingir e faltar a tal governabilidade.
O melhor caminho para a base governista, incluindo o PT, seria entender que os tempos estão mudando e as práticas políticas precisam mudar também. A governabilidade pode ir embora não por causa da faxina, mas por causa da corrupção. É o chavão mesmo: a base tem de perder os anéis para não perder os dedos. Mas parece que a maioria não está entendendo isso. O governador Sérgio Cabral contrata emergencialmente, mais uma vez, a empresa de seu amigo. Os líderes do PT e do PMDB indicam os deputados João Paulo Cunha e Eduardo Cunha para a comissão de revisão da lei de processo penal.
Os principais focos da corrupção já estão mais do que detectados: campanhas eleitorais caras e financiamento de campanhas pelo caixa um ou pelo caixa dois; emendas parlamentares que beneficiam empresas ou ONGs e dão retorno a seus autores e a prefeitos; ocupação de funções comissionadas em órgãos públicos, e que permitem manipular contratos e liberar pagamentos; liberação de recursos federais para prefeituras e governos estaduais com a intermediação de parlamentares.
Os que querem mudar o quadro de corrupção epidêmica e sistêmica devem exigir a continuidade da tal faxina, mas a principal preocupação deveria ser combater os focos. Do mesmo jeito que se pressionou pela Lei da Ficha Limpa, que o Congresso não queria mas aprovou, pode-se pressionar deputados e senadores para mudar os mecanismos que hoje favorecem a corrupção.
A maioria dos deputados e senadores não vai querer mexer no que hoje lhes beneficia, é natural que seja assim. Mas se a pressão for forte, acabarão aceitando mudar algumas coisas. Ainda não se fala nisso, mas se a situação continuar assim e a pressão da sociedade aumentar, não se deve descartar inclusive a convocação de uma constituinte exclusiva para fazer o que os parlamentares não querem fazer.
O que hoje é muito improvável, com o tempo pode acontecer.
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