Ilustração do Blog |
por Ricardo Kotscho
Maluf já tinha conseguido tudo o que queria do PT:
colocar um cupincha do PP no Ministério das Cidades e a garantia de cargos na
área de habitação da prefeitura caso Fernando Haddad seja eleito.
Nesta segunda-feira, com tudo acertado para o
acordo ser celebrado pelas direções dos dois partidos num almoço em sua
latifundiária mansão da rua Costa Rica, no Jardim América, o criador do
malufismo resolveu tripudiar: exigiu a presença do ex-presidente Lula no
almoço.
Deu a entender a interlocutores do PT que, sem
tirar uma foto com Lula em seus belos jardins, não selaria a aliança. A esta
altura, já era certo que o ex-presidente não iria ao casamento, por
recomendação dos médicos, que lhe recomendaram distância dos atos políticos por
mais alguns dias para poupar a voz.
Pelo mesmo motivo, Lula não participou do ato, na
última sexta-feira, em que o PSB oficializou seu apoio ao PT com a indicação da
ex-prefeita Luiza Erundina para vice de Haddad. Erundina, que já estava
inconformada com esta aliança, ficou magoada, e ameaçou pular do barco.
Nunca se vai saber se Maluf, como é de seu costume,
estava apenas blefando ou se levaria até o fim a chantagem. O fato é que Lula
não quis pagar para ver e acabou se submetendo a uma cena constrangedora diante
da imprensa como se tivesse sido obrigado a fazer uma coisa que não queria. Por
conhecê-lo bem e ser seu amigo faz mais de 30 anos, posso imaginar quanto deve
ter sido difícil para ele tomar esta decisão.
Sabemos todos que nestes tempos modernos de
política pragmática os acordos eleitorais são feitos não mais baseados em
programas partidários, mas em tempo de TV, cargos e verbas, que se transformam
em votos e decidem vitórias ou derrotas. Não existem santos nem inocentes neste
jogo pesado. Mas precisava da foto?
Em eleições, só é feio perder, costumam dizer os
marqueteiros e estrategistas nos comitês de campanha. Além de votos, porém, a
política também é feita de símbolos e de fatores subjetivos como a esperança, a
confiança e a lealdade a certos princípios e valores.
Por longo tempo, desde a sua fundação, em 1980, o
PT e Lula, seu principal líder, simbolizavam esta esperança de que a política
pudesse ser feita de outro modo, sem que fosse preciso vender a alma ao diabo.
Paulo Maluf sempre representou exatamente o oposto. Sou do tempo em que Lula
era inimigo de Maluf e vice-versa. Sempre fiquei ao lado de Lula.
A realidade do poder, no entanto, foi maior do que
o sonho e, hoje, ao ver esta foto em todos os jornais, muitos eleitores,
principalmente os mais jovens, perderam as referências.
O pior de tudo foi ver o sorriso de vitorioso de
Paulo Maluf ao passar a mão na cabeça de Fernando Haddad sob o olhar conformado
de Lula. As eleições passam, mas esta foto vai ficar na memória como sinal de
um tempo _ um tempo de descrença na política e nos valores democráticos.
Heródoto Barbeiro me perguntou ontem à noite no Jornal
da Record News se este apoio de Maluf vai dar ou tirar votos do PT. Não
soube responder, e também não importa. Minha conta não é essa.
E se o Maluf fechasse o acordo com o Serra, o que
você diria?, perguntam-me alguns leitores. Eu não diria nada, até porque seria
algo absolutamente normal, dentro do previsível e, portanto, nem daria manchete
nos jornais. Boi preto com boi preto não chamam a atenção de ninguém.
A mais antiga história sobre jornalismo é aquela do
cachorro que morde o homem e a do homem que morde o cachorro. Notícia é o que
foge à normalidade, e esta foto na mansão de Paulo Maluf se enquadra no caso do
homem que mordeu o cachorro.
Do ponto de vista puramente eleitoral, para mim não
muda muita coisa ter um minuto a mais ou a menos no horário político obrigatório,
já que o candidato tucano José Serra, no mesmo dia em que perdeu o apoio de
Maluf, correu atrás do tempo de televisão do PTB de Roberto Jefferson, depois
de ter vencido o leilão do PR de Valdemar da Costa Neto.
Neste
negócio de ganhar ou perder apoios, ninguém vai poder falar nada de ninguém.
Quem mais perde, com certeza, é o eleitor, cada vez mais descrente nos rumos da
política brasileira. É triste.
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