terça-feira, 20 de março de 2012

Confrontar Dilma não é a solução para os homossexuais

por Eduardo Gurimarães, no Blog da Cidadania

Não diria que fiquei surpreso com o tom adotado pelo ativista pelos direitos dos homossexuais e fundador do Grupo Gay da Bahia Luiz Mott para se referir ao governo Dilma em vídeo que gravou em protesto contra a falta de empenho desse governo em distribuir kits anti-homofobia nas escolas públicas e em apoiar o projeto de lei que tramita no Congresso Nacional que equipara a homofobia ao crime de racismo.

Antes de prosseguir, é necessário assistir ao vídeo.




Luiz Roberto de Barros Mott nasceu em São Paulo e é oriundo de tradicional família de Juiz de Fora. Formou-se em Ciências Sociais pela USP. Possui mestrado em Etnologia pela Sorbonne e doutorado em Antropologia pela Unicamp. É conhecido no Brasil e no exterior por seus estudos sobre a homossexualidade.

Os movimentos de defesa dos direitos dos homossexuais integram um grupo crescente de movimentos sociais que vêm se indispondo com o governo Dilma Rousseff. Pode-se citar, sem maior esforço, movimentos de sem-terras, movimentos de mulheres e considerável parcela do movimento sindical.

Penso que Mott talvez tenha sido demasiadamente incisivo, mas não lhe tiro a razão pelo mau-humor em relação ao governo federal. Em questões como a dos direitos dos homossexuais, do aborto, da reforma agrária e outras, a tentativa desse governo de afagar os conservadores tampouco é a mais coerente.

Dilma corre o risco de ficar sem o apoio de tais movimentos e também sem o dos conservadores a que pretende agradar ao vetar o que eles chamam de “kit gay” ou ao não apoiar o projeto de lei que criminaliza a homofobia, pois dificilmente os grupos homofóbicos deixarão de se inclinar, lá adiante, pelos candidatos conservadores autênticos.

De qualquer forma, as reclamações de Mott são pertinentes, sobretudo no que diz respeito a políticas públicas para combater a homofobia no nascedouro, que nada mais são do que as que influam na educação que meninos e meninas recebem em casa e na escola desde a primeira infância.

O que direi não será surpresa para ninguém, mas muita gente não percebe fatos que gritam para ser notados. Nossa sociedade educa suas crianças e adolescentes para nutrirem ódio pelos homossexuais, a vê-los como aberrações e a ter reações violentas contra eles até quando a homossexualidade de alguém não passa de suspeita.

Há uma pressão social velada para que as pessoas condenem a homossexualidade e para que os pais eduquem seus filhos de forma a que considerem os homossexuais como pessoas repulsivas e degeneradas.
Na ânsia de tentarem “vetar” tendências ou simpatias de crianças e adolescentes pela homossexualidade, como se fosse possível extinguir uma orientação sexual quando ela existe ou criá-la quando inexiste, só resta a transformação do homossexual em um ser abjeto.

Os meninos morrem de medo de ser confundidos com homossexuais. Na escola, a mera suspeita de tendência homossexual expõe o suspeito a todo tipo de violência, seja física ou verbal. Em casa, é comum a criança ou o jovem ouvirem do pai, da mãe ou de ambos que prefeririam ver um filho ou uma filha “gays” mortos a aceitarem sua natureza, isso quando não ameaçam com violência e até expulsão do lar.

A ciência há muito já detectou que a tendência à homossexualidade é uma característica intrínseca do ser humano e que não pode ser construída ou desconstruída, ou seja, não se pode obrigar quem gosta do sexo oposto a gostar do mesmo sexo e vice e versa. E o indivíduo pode dissimular uma tendência, reprimi-la, mas não pode eliminá-la da própria natureza.

Nesse aspecto, o kit anti-homofobia seria importante para apresentar a questão da homossexualidade como ela é, sem convencer ou desconvencer ninguém, pois está provado – repito - que é impossível fazer alguém gostar do mesmo sexo, por exemplo, se a natureza desse indivíduo o impele a gostar do sexo oposto.

Todavia, ainda não seria suficiente. Os homofóbicos patológicos, aqueles capazes de partir para agressão física diante da menor suspeita de que alguém possa ser homossexual, frequentemente são oriundos de lares em que o pai e – não raro – a mãe estimulam até mesmo a agressão a homossexuais, mesmo que não preguem claramente agressão física, pregando “apenas” violência verbal ou comportamental.

Sendo assim, o kit anti-homofobia, apesar de não ser tudo o que deveria ser feito contra a verdadeira caça às bruxas que vem sendo desencadeada por setores religiosos e até políticos contra homossexuais, bem como uma legislação que iniba a difusão do discurso homofóbico, que claramente estimula a violência, são medidas inadiáveis.

Interesses políticos, no entanto, inibem ações do Estado nesse sentido. Talvez a única forma de lograr êxito, portanto, seja buscar pressão internacional. Como no caso da pressão de organismos multilaterais para que o Brasil puna os crimes da ditadura militar, Luiz Mott e outros ativistas fariam melhor se investissem nesses organismos como meio de impedir que o governo Dilma caia nos braços dos ultraconservadores.

A confrontação dos movimentos de homossexuais com a única alternativa política viável para eles é inútil porque ninguém imagina que em 2014, caso sobrevenha a ameaça de eleição de alguém como José Serra, por exemplo, esses movimentos fiquem neutros, esperando que seja eleito alguém que, no Poder, tornar-se-á o braço dos intolerantes.

Sou amplamente solidário ao movimento pelos direitos dos homossexuais. Considero uma vergonha – e um sinal de atraso do país – que não produzamos uma legislação moderna e libertária para essas vítimas da burrice e da intolerância, de forma que deixo este apelo para que os guerreiros dessa nobre causa repensem a estratégia em tela.

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