quarta-feira, 13 de junho de 2012

Merval sai em defesa da mídia tradicional


Foto: Divulgação
por Brasil 247 – Em sua coluna no jornal O Globo, o jornalista Merval Pereira criticou as declarações de José Dirceu sobre uma suposta pressão da mídia pelo julgamento do mensalão. Leia:

A luta dos petistas às vésperas do julgamento do mensalão como sempre está muito bem coordenada, e parece ter mais uma vez na figura do ex-ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos o articulador das manobras políticas no campo jurídico, enquanto outro ex-ministro, José Dirceu, é o braço político-partidário das pressões sobre o Supremo Tribunal Federal. O criminalista Márcio Thomaz Bastos representa o ex-diretor do Banco Rural José Roberto Salgado, um dos réus do mensalão, enquanto Dirceu é classificado como “chefe da quadrilha” pela Procuradoria-Geral da República. 

O fato de ser bem coordenada não significa que dê resultados, como está se vendo na CPI do Cachoeira, imaginada por Lula e Dirceu para inviabilizar o julgamento do mensalão, ou na pressão do ex-presidente sobre ministros do STF, que, na prática, acabaram provocando um clima de mal-estar na opinião pública que levou à marcação do julgamento para o dia 1 de agosto. Assim como por ocasião do mensalão foi Thomaz Bastos quem criou a tese de que o que acontecera foi o uso do caixa 2 nas campanhas eleitorais, um crime eleitoral menor, agora a tese de que a mídia faz “publicidade opressiva” sobre o caso, interferindo na imparcialidade do julgamento, é também de sua autoria, enquanto Dirceu politiza a questão de maneira mais direta, conclamando a UNE e a Juventude Socialista do PC do B a saírem às ruas para defendê-lo na “batalha final”. 

Alegando que o “monopólio da mídia” quer condená-lo a qualquer custo, Dirceu exige um “julgamento técnico”, mas, no discurso, diz que “este julgamento é uma batalha política” que “deve ser travada nas ruas também”, marcando não apenas a contradição entre suas palavras e atos, mas, sobretudo, uma ameaça de pressão ilegítima de forças do aparelho partidário sobre o Supremo Tribunal Federal nunca vista antes.

O ex - Ministro Thomaz Bastos diz que acha “fundamental” a vigilância da imprensa, “mas só até certo ponto”, pois quando ela erra, coloca em risco a imparcialidade dos julgamentos: ele se refere com frequência ao “peso que a imprensa tem na opinião pública e do peso que a opinião pública e a imprensa têm nos julgamentos.”, admitindo que essa influência é maior nas sentenças proferidas pelos tribunais de júri e pelos juízes singulares. 

Mas, admite, “os tribunais superiores não estão livres do fenômeno. O juiz lê jornal, assiste televisão. O juiz não é marciano, mora na Terra, no Brasil.(...) O que ele lê de manhã, o que ele conversa com a mulher, ajuda ele a fazer um juízo.” 

Marcio Thomaz Bastos diz que quando a mídia exerce pressão ilegítima, “o julgamento se torna uma farsa.”. Ele teme que isso ocorra no julgamento do mensalão. Mas, como Ministro da Justiça e depois conselheiro do ex-presidente Lula, Thomaz Bastos teve influência direta ou indireta na indicação de pelo menos seis dos atuais 11 ministros do STF, e seus receios e advertências soam como uma tentativa de pressão sobre o colegiado. 

O interessante nessa discussão toda, e mais ainda quando se sabe que os petistas estão armados de pareceres jurídicos que falam sobre os efeitos do noticiário nos julgamentos, é discutir o papel da mídia nas modernas democracias. 

O ex-presidente Lula montou um esquema midiático oficial, com a TV Brasil, e oficioso, com blogs e revistas chapa-branca financiados por dinheiro público para tentar neutralizar a influência da mídia tradicional, considerada “oposicionista” pelo governo. 

O próprio Lula, inebriado pelas vitórias eleitorais, chegou a anunciar em um palanque que “nós não precisamos de formadores de opinião. Nós somos a opinião pública". Pois agora toda a defesa dos mensaleiros é baseada na força descomunal da mídia, a influenciar a opinião pública, que por sua vez pressiona o Supremo. 

Nas palestras que tenho feito sobre o papel da imprensa, ressalto que a mídia exerce a função socialmente relevante de ser um canal de comunicação que liga Estado e Nação, mas também os muitos setores da Nação entre si. 

É sua atribuição fazer com que o Estado conheça os desejos e intenções da Nação, e com que esta saiba os projetos e desígnios do Estado. Ainda, incumbe à imprensa permitir à sociedade acompanhar, com severidade de fiscal, aquilo que os Governos fazem em seu nome e, supostamente, em seu benefício. 

No sistema democrático, a representação é fundamental, e a legitimidade da representação depende muito da informação, que aproxima representados e representantes. 

É uma decisão ética quotidiana e obrigatória do jornalista determinar se o interesse público é servido ou não pela invasão da privacidade de alguém. Decisões irresponsáveis e levianas produzem o sensacionalismo, os escândalos gratuitos e, em pouco tempo, a desmoralização da imprensa. 

Decisões tímidas e políticas no pior sentido do termo produzem um jornalismo desligado do interesse público - e, em pouco tempo, também a desmoralização da imprensa. 

(...) Uma das primeiras funções da mídia é fornecer informação às pessoas para que estas sejam livres e capazes de se autogovernar. A "opinião pública" surgiu no fim do século XVIII, através principalmente da difusão da imprensa, como maneira de a sociedade civil nascente se contrapor à força do Estado absolutista, e legitimar suas reivindicações. Não é à toa, portanto, que o surgimento da "opinião pública" está ligado ao estado moderno. 

Governantes que temem a liberdade de imprensa, numa tentativa de desacreditar os meios de comunicação, disseminam a ideia de que a mídia não representa a "opinião pública", mas apenas a elite da sociedade, não os cidadãos de maneira geral. 

O correto conceito de controle social, no entanto, é, na verdade, das organizações civis da sociedade sobre os governos e as instituições de Estado, e não dos governos e partidos sobre a sociedade.



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