quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

A Educação de Aécio


Ilustração do Blog (Imagem internet)
Se o senador carioca, com domicílio eleitoral em Minas Gerais, escrevesse sobre educação fazendo autocrítica de sua triste trajetória política sobre o tema, certamente suas superficiais preocupações poderiam até ser valorizadas.
Em seu artigo semanal (FSP 30/01/2012) ele começa escapando de debater os “números” da educação no Brasil. Segundo ele, há aí uma “matemática cruel que pouco soma e muito subtrai” - indicando “um dos piores cenários da exclusão social no âmbito da nossa sociedade”. Tenta ele, então, destacar um dos déficits educacionais no país: o da qualidade.
Primeiro, não discutir números e estatísticas nacionais é mera desculpa para não se defrontar com os dados mineiros: nos seus sete anos e três meses de governo, o vencimento básico de profissionais da educação era menor que o salário mínimo; fraudou-se o limite constitucional que o estado deveria aplicar na educação (25%), com a inclusão de gastos vedados em lei; enfrentou greves e movimentos sucessivos, por melhorias nos salários e condições de trabalho; criminalizou sindicatos, lideranças e movimentos, com atitudes de fazer inveja à Ditadura Militar, etc. Os indicadores “mineiros” da qualidade são sofríveis.
Em segundo lugar, a leitura do seu texto nos leva à seguinte frustração: nada há de substantivo que discuta o tema “qualidade”. Como sempre, temos o uso de frases de efeito, numa sucessão de platitudes, e um monte de referências cuja única finalidade é “encher linguiça”.
Ou seja, Aécio não discute números porque em seus 25 anos de vida pública (como ele gosta de se apresentar), suas “obras completas” sobre a educação se resumem a um grande livro de capa grossa e 500 páginas em branco. Foram 16 anos na Câmara em Brasília, sete anos e três meses como governador e um ano de senado, nos quais nada ele pode demonstrar, em termos de prioridade na educação. Sobretudo no quesito qualidade. E é por isso que seu texto é vazio de conteúdo.
Na ausência de argumentos para com ele debater, naquilo a que se propôs, só resta a este Aparte analisar o amontoado de expressões, frases, orações desconexas, para demonstrar a vacuidade teórica, política e estratégica do senador carioca.
Vamos para o segundo parágrafo do texto. Este é composto por duas orações. A primeira ressalta a velha novidade de que nenhuma nação será grande se “os bancos escolares não servirem de ponto de partida para o nascimento de cidadãos plenos, bem informados e academicamente preparados”. A segunda oração: “Mas também cidadãos donos de suas própria opiniões, resultado de um esforço coletivo (…) que vá muito além das demandas do mercado de trabalho”. Ora, o “mas” é uma conjunção coordenativa adversativa e deve ser usada entre duas frases ou orações para estabelecer contrastes entre uma e outra. Exemplo: o dia está ensolarado, “mas” pode chover. No parágrafo citado, a segunda oração em nada contrasta com a primeira. Conclui-se que é puro “encher linguiça”.
Depois, ele homenageia um autor mineiro, Bartolomeu Queirós, falecido em 16 de janeiro, “reconhecido internacionalmente, reverenciado em Minas e respeitado por tantos autores nacionais”. A assessoria do Movimento Minas Sem Censura vasculhou os sete anos e três meses de governo Aécio para tentar achar algum lugar de destaque, nas políticas educacionais do estado, que comprovassem a citada reverência, pelo menos de seu governo ao educador em tela. Sinceramente, seu governo acabou devendo isso à memória do amigo “Bartô”, como a ele se refere, pedindo licença para o trato íntimo, em nome do “afeto da amizade” entre os dois. Nem sequer nos seus discursos em 16 anos de Câmara e um de senado há deferências ao educador citado. Aliás outra expressão esquisita: o que o “afeto da amizade” tem com a licença pedida? Entrando no clima, a “redundância pleonástica” contida na expressão, nos faz perguntar sobre algum “desafeto da amizade” ou “afeto da inimizade” que justificasse a distinção da licença pedida. Nesse sentido, Aécio está mais para o memorável Odorico Paraguassu (personagem vivido por Paulo Gracindo em sua carreira de ator), do que para um mediano “trainee” à Academia Brasileira de Letras.
Eis porque o uso do nome do autor mineiro, Bartolomeu Campos de Queirós, é simples oportunismo e, com isso, um desrespeito à sua memória. Aliás, de triste memória há um “Bartolomeu” que não pesa na consciência de senador. Ou, pelo menos a avenida que leva seu nome: Bartolomeu Mitre, no Leblon. Lá, Aécio deu péssimos exemplos para a educação no país: carteirada de senador, recusa em soprar o bafômetro, privilégio ao não ser conduzido à delegacia. Para falar, ou assinar, artigos sobre educação, nosso Paulo-Freire-elevado-a-menos um, deveria servir na bandeja, como exemplo, sua própria trajetória educacional, como assíduo e destacado estudante de economia na PUC MG, ou como dedicado parlamentar e ex-governador. Como não pode fazê-lo, deveria começar a escrever pedindo desculpas aos educadores e educadoras de Minas!

Educar (FSP 30/01/01), por Aécio Neves
Vamos deixar de lado, por um instante, aquilo que a educação no Brasil tem de números, numa matemática cruel que pouco soma e muito subtrai -um dos piores cenários da exclusão social no âmbito da nossa sociedade. E falar de outro tipo de deficit educacional: o deficit da qualidade.

Não existe, sabemos, a menor possibilidade de uma nação figurar entre as grandes do mundo -e esta é uma justa e viável aspiração do povo brasileiro- se os bancos escolares não servirem de ponto de partida para o nascimento de cidadãos plenos, bem informados e academicamente preparados. Mas também cidadãos donos de suas próprias ideias e convicções, resultado de um esforço coletivo aluno-professor-instituição que vá muito além das demandas do mercado de trabalho.

Trato desse tema hoje e escolho essas palavras para fazer uma homenagem ao escritor Bartolomeu Campos de Queirós, falecido neste mês.

Reconhecido internacionalmente, reverenciado em Minas Gerais e respeitado por tantos autores nacionais, Bartô -permitam-me o afeto da amizade- dedicou sua inteligência apurada e sua militância sensível às causas da educação e da literatura.

"O homem é feito de real e de ideal", dizia ele, no depoimento que acompanhou o manifesto fundador do Instituto Brasil Literário, organização não governamental cuja causa ele abraçou com dedicação. Sendo assim, prosseguia, a educação não pode se contentar em informar o que já foi feito e, sim, abrir a porta para a imaginação e a fantasia.

Se a escola é o lugar da transformação, e não somente o da informação, não há como aceitar a redução dos currículos à acumulação estatística de saberes específicos.

Ao liberar o direito de todos de criar, recriar, imaginar e romper o limite do provável- dizia ele- a educação estará exercendo o imprescindível dom da democratização.

Em lugar de impor dogmas, cabe fermentar, no cultivo da dúvida e da inquietação, o direito cidadão de firmar sua trajetória cultural e intelectual. Refletir deixa de ser, assim, um privilégio de classe.
Aprendemos muito com pessoas como Bartolomeu. Ele estava convencido de que a literatura poderia ser o grau zero para o profícuo estímulo da imaginação criadora.

Dirão os céticos: tudo isso é romântico demais quando se trata de reparar, já, agora, deficiências bem pragmáticas no ensino brasileiro.

As prioridades cobram atitudes imediatas, é verdade. Mas que qualquer iniciativa se assente em base humanista, sem desprezar a dimensão que a educação encerra de valores fundamentais ao ser humano.

Como disse nosso escritor: "A gente só suporta o dia de hoje porque tem uma perspectiva do amanhã".

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