segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O machismo da mídia

Por Fernando Brito, no Tijolaço

Quando eu era um estagiário da editoria de Esportes de O Globo, no final dos anos 70, contava-se a história de que  ao descer à redação, coisa que não fazia muito, um dos irmãos de Roberto Marinho – se ainda me recordo, Rogério – perguntou a um velho funcionário do jornal, espantado com a quantidade de mulheres na redação:

- Mas elas se comportam direitinho?

Três décadas e meia depois, o comportamento da imprensa em relação às mulheres que chegam aos cargos de poder político parece lembrar este comportamento.

O Estadão, a partir de uma boa reportagem de Sérgio Torres, onde a futura presidente da Petrobras, Maria das Graças da Silva Foster, é apresentada como uma lutadora, boa mãe e amiga, militante política e até capaz de fazer-se pequenas tatuagens, é chamada de “dama de ferro”;. Expressão, aliás, que o repórter jamais utiliza.

Em outra “reportagem” a coisa é com Dilma. É chamada de autoritária e até – novamente a editoria – tem sua antessala definida como “sala de torturas”, porque todos teriam medo do que irá acontecer ao encontrarem a presidenta. O seu defeito? Ela “se irrita com promessas não cumpridas, projetos que não param em pé, pressão de aliados políticos por cargos no governo e “vazamentos” de notícias. Erros de português e números trocados também a tiram do sério”.

Ora, francamente, era para gostar? Cidadãos adultos, Ministros de Estado, dirigentes de empresas públicas, só porque vão tratar com uma chefe mulher devem esperar, ao deixarem de ser consistentes e competentes, a serem tratados na base do “bilú-bilú”? Isso é uma idiotice total e, que espera algo assim, não deve levar uma, mas duas broncas: além da ineficácia, outra pela visão deformada que têm da condição feminina.

Mas como Dilma e Graça são mulheres, o fato de serem chefes exigentes é – e nem tão veladamente assim – criticado. “Gerentona”, “dama de ferro”, “duríssima”, “exigente” são alguns dos rótulos que lhes pregam.
Ora, as duas têm um trabalho duro, difícil, onde cada erro, além da exposição política, causa prejuízo ao povo brasileiro. Não estão ali por carreira ou brincadeira, nem pelo salário, apenas. Têm uma imensa responsabilidade.

Fossem homens, ninguém iria lhes cobrar gentilezas e rapapés. E é exatamente por esse comportamento machista, que acha que mulheres devem ser “polianas” que, às vezes, até têm de subir uma ou duas oitavas o tom do comando, porque sempre vai haver um bobalhão achando que ordem de mulher não é como ordem de homem e que é possível enrolá-las com “jeitinho”.

Ter chefe exigente e “cobrador” nunca foi problema para ninguém.

Pessoalmente, trabalhei por mais de 20 anos com uma pessoa tida como difícil e autoritária, Leonel Brizola. Nem era, mas também não era “um docinho”, nem deveria ser.  Isso nunca me fez mal algum e muito menos me tornou um cordeirinho amedrontado, por duas razões.

A primeira, retidão e lealdade. A segunda, um própósito em comum, como se deve ter quando se está em um projeto de mudança de um país. Levei algumas broncas e “peitei” algumas coisas e ninguém saiu machucado disso. E ele próprio, o mais velho, tomava a iniciativa de minimizar o estrago: “lenha boa é que sai faísca”, dizem bem os gaúchos.

Será que deve ser diferente só porque é uma mulher?



Nossos meios de comunicação, tão “moderninhos” e “politicamente corretos” deviam ter vergonha de pensarem como há 35 anos pensava o irmão Marinho, parte de um tempo no qual o mais importante que se podia dizer de uma mulher era  ser “senhora do Fulano de Tal”.

Que vergonha!


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